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O que é Due Diligence e qual sua Importância na Contratação e Gerenciamento de Terceiros?

O termo em inglês Due Diligence pode ser traduzido ao português como devida diligência ou diligência prévia. Essa terminologia é bastante utilizada no mundo corporativo para se referir ao processo que visa analisar, estudar e avaliar informações detalhadas de uma determinada sociedade empresarial.

De modo geral, tal mecanismo é de suma importância nas operações comerciais das empresas, visto que nas situações de formação e gerenciamento de parceiros comerciais (terceiros), bem como nas operações de fusão e aquisição.

Em suma, a realização do Due Diligence possibilita uma visão global dos riscos emanados do negócio a ser firmado, possibilitando, assim, uma melhor estruturação do acordo, ou até mesmo a demonstração da inviabilidade daquele negócio, dependendo dos diversos riscos que expõe aquela organização. Além do mais, serve como forma de dirimir conflitos entre as partes[1].

No ponto relativo a contratação e gerenciamento de terceiros, observa-se que ao estabelecer um processo de Due Diligence, a empresa poderá analisar os mais variados assuntos, como os aspectos financeiros, contábeis, previdenciários, trabalhistas, imobiliários, tecnológicos, jurídicos ou qualquer outro ponto que seja pertinente ao caso em análise.

Como por exemplo, contratação de escritórios de advocacia que prestam serviços à alguma organização. A partir desse exemplo, evidencia-se uma variedade significativa de riscos inerentes desses intermediários, pois diversos deles possuem contato direto com órgãos públicos e/ou empresas, cuja a idoneidade é duvidosa. Assim, caso esse risco não seja devidamente mitigado a empresa que contratou o escritório de advocacia pode se envolver indiretamente com atos de corrupção praticados em nome dela, com sua autorização ou não para o delito.

Outro exemplo muito interessante é o caso de um distribuidor de medicamentos  que repassa para determinado hospital um remédio sem estar em plena condição de uso. Isso significa que, por mais que a empresa fabricante do medicamento tenha feito o repasse da forma correta, bem como advertido o distribuidor sobre as condições de armazenamento, o remédio será entregue sem a menor possibilidade de uso. E tal situação, pode gerar um risco midiático e financeiro sem precedentes à fabricante, conforme os julgados mais recentes dos nossos tribunais.

Assim, como de fácil percepção, é de suma importância estabelecer um processo de Due Diligence para a contratação e gerenciamento dos parcerios comerciais. Até porque, conhecer bem seus parceiros e saber quais são os principais riscos que eles o expõe é muito significativo. 

Além do mais, com a implantação do referido processo, é possível reconhecer quais são os parceiros comerciais que oferecem menos riscos e trazem o melhor resultado, para em seguida, eliminar os de menor eficiência, a fim de gerar maior segurança jurídica, proteção de imagem e ampliação do resultado financeiro.

José Cordeiro

Advogado e Sócio do Carlos Queiroz Advogados.


[1]     ROCHA, Dinir Salvador Rios da; QUATTRINI, Larrisa Teixeira (coords.). Fusões, aquisições, reorganizações societárias e due diligence. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 40.

Relevância do Programa de Compliance para Contratação de Parceiros Comerciais

Apesar de não ser nenhuma novidade para multinacionais e corporações que mantêm relações comerciais com outros países, os programas de compliance começaram a receber um maior destaque no Brasil após a entrada em vigor da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/13), que representa um importante avanço em relação ao tema no Brasil. Os diversos escândalos, principalmente no cenário político e empresarial, ensejaram uma onda de revolta por parte da população, o que resultou na criação de leis e “programas anticorrupção” que exigem a existência de conformidade em diversos âmbitos.

Um dos pontos que mais chama atenção na legislação é o conceito de “responsabilidade solidária”, que pode penalizar empresas pelos atos irregulares cometidos por seus funcionários e terceiros em desfavor da administração pública. Para haver a responsabilização da empresa, a legislação não exige que aquele ato ilícito seja conhecido ou aprovado pela alta administração da empresa. A única exigência legal é que a organização seja beneficiada de alguma forma pelo cometimento daquele ato inidôneo.

Desta forma, diversas empresas vêm realizando diligências apropriadas para contratação e supervisão de terceiros, como fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados. O que se percebe, é que diversas empresas não estão considerando apenas o preço para contratar um serviço ou um fornecedor. Atualmente, avaliar a reputação da empresa e seus valores é de suma importância. 

Tanto que as grandes empresas eliminaram a possibilidade de uma única pessoa, isoladamente, contratar um serviço de alto valor, pois as decisões devem ser tomadas por mais de uma pessoa ou por um comitê de investimento, que conta com pessoas de vários setores da empresa, a fim de se obter uma visão mais sistêmica da contratação.

E essas novas exigências não são exclusivas do setor privado brasileiro. Na verdade, trata-se de uma tendência também no setor público. Para tanto, basta observar as legislações que impõe a implementação de programas de integridade na empresas que contratem com o poder público do Distrito Federal e do Rio de Janeiro.

Assim, o que se percebe é que trabalhar de forma idônea é um ônus de quem faz negócios, pois a partir do estabelecimento de boas práticas empresariais é possível ampliar o leque de oportunidades da empresa. Além do mais, ter um programa de compliance não é apenas um diferencial ou um ativo intangível, trata-se também de algo essencial para empresas que desejam fazer negócios com grandes corporações, bem como é algo fundamental para organizações que almejam contratos com o poder público.

José Cordeiro

Advogado e Sócio do Carlos Queiroz Advogados.

A Responsabilidade Subsidiária da Contratante nos Contratos de Prestação de Serviços

Costumeiramente, há, no âmbito empresarial, a subcontratação de empresa especializada para a realização de atividades em geral, através de contrato de prestação de serviços.

Inclusive, a subcontratação propicia maior eficiência no serviço, assim como redução de custos para a empresa contratante, pois se trata da colocação de empresa especializada na realização de atividades específicas, para as quais foi contratada.

Todavia, apesar das benesses envolvidas no processo de subcontratação, é dever da empresa contratante promover, regularmente, a checagem da relação da empresa contratada perante os seus colaboradores, mesmo sem a existência de vínculo empregatício com estes.

Isto ocorre pois a empresa tomadora dos serviços poderá ser responsabilizada nas esferas trabalhista e previdenciária por dívida contraída das relações de emprego existentes entre a empresa terceirizada e os seus colaboradores. Ou seja, a empresa contratante poderá ser responsabilizada judicialmente por fatos alheios à sua gestão, oriundos do vínculo empregatício existente entre terceiros. Este é o entendimento consolidados dos Tribunais.

Assim, para preservar seu patrimônio, a empresa contratante deverá inserir cláusulas contratuais capazes de elidir a responsabilidade civil decorrente da condenação da empresa contratada em débitos trabalhistas. Tais cláusulas poderão municiar a empresa contra a situação acima relatada, através do ajuizamento de ação de regresso, aplicação de multa e/ou rescisão contratual.

Igualmente, a negociação e estipulação de cláusulas contratuais específicas contribuem para evitar possíveis litígios advindos de um caso prático. Assim, a expressa previsão contratual poderá precaver a empresa quanto ao seu patrimônio, evitando prejuízos financeiros inesperados, bem como poderá propiciar à empresa contratante a possibilidade de pleitear indenizações.

Alexandre Asfora da Cunha Cavalcanti Filho

Advogado, membro do time Carlos Queiroz Advogados.

O Novo Espectro da Lei de Lavagem de Dinheiro/Capitais

Sua atividade (Pessoa Física ou Jurídica) encontra-se no rol atividades sensíveis da Lei de Lavagem de Dinheiro?

         Dito rol, encontra-se encartado no art. 9º[1] da Lei 9.613/1998 (Lavagem de Dinheiro).

         Pois bem.

         As pessoas físicas e jurídicas, previstas no famoso rol do art. 9º da Lei, estão afetas a uma série de obrigações acessórias nas suas operações do dia a dia (art. 10[2] e 11[3] da Lei), sob pena de sofrerem sanções administrativas e penais, esta última, notadamente, recaindo nas pessoas dos sócios, acionistas e dirigentes das empresas.  

Neste cenário, da “nova” de Lei de Lavagem de Dinheiro, nasceu um novo espectro do seu alcance, especificamente pelas obrigações administrativas que as pessoas físicas e jurídicas passam a ter, sob pena de responderem pelo crime de Lavagem de Dinheiro.

         Em síntese, as obrigações acessórias são: a) identificação de seus clientes e manutenção do cadastro atualizado; b) registro de toda transação em moeda nacional e estrangeira; c) cadastrar-se e manter seu cadastro atualizado no órgão regulador e fiscalizador; d) atender às requisições formuladas pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF[4]) etc.

Esse dever de cumprir tais obrigações acessórias, exige, hoje, dos dirigentes de empresas[5], um dever de cuidado especial[6] (dever de proteção e vigilância, diante da incorporação pela doutrina e jurisprudência brasileira da Teoria do Domínio do Fato e Teoria da Cegueira Deliberada[7]).

Gustavo Badaró e Pierpaolo Bottini (Lavagem de Dinheiro, p. 13, 2016):

“(…) esse cenário de apuração mais rigorosas de práticas de lavagem de dinheiro tem levado empresas e profissionais privados a implementar programas de integridade e de idoneidade, voltados a prevenção do delito.”

         Sem embargo, adotar um Programa[8] de Integridade e Compliance[9] efetivo no cenário empresarial atual é de extrema importância.

Carlos Queiroz

Advogado. Especialista e Sócio da Carlos Queiroz Advogados.


[1]                              Redação dada pela lei nº 12.683, de 2012. DAS PESSOAS SUJEITAS AO MECANIMO DE CONTROLE.

[2]                              Da Identificação dos Clientes e Manutenção de Registros.

[3]                              Da Comunicação de Operações Financeiras.

[4]                              Visitar: (Res. 06/1999); (Res. 07/1999); (Res. 10/2001); (Res. 23/2012); (Res. 25/2013); (Res. 24/2012); (Res. 21/2012), todas do COAF.

[5]                              Estellita, Heloisa.- 1. ed. – São Paulo: Marcial Pons, 2017.

[6]                              Art. 13 – O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.Relevância da omissão. § 2º – A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;

[7]                             AP 470, STF.

[8]                              Modelo adequado: “modelo de independência funcional. Aqui o setor de prevenção de lavagem de dinheiro tem equipe e estrutura própria e é coordenado por alguém com contato direto com a Presidência ou com o Conselho de Administração. Tal formatação melhor estruturada parece a mais adequada por abrigar uma divisão clara de atribuições e permitir que informações relevantes cheguem à alta direção, evitando imputações posteriores a título de negligência ou de cegueira deliberada.” Gustavo Badaró e Pierpaolo Bottini (Lavagem de Dinheiro, 4ª edição, p. 53, 2019)

[9]                              “(…) o dever de cumprir, de estar em conformidade e fazer cumprir leis, diretrizes, regulamentos internos e externos, impostos às atividades da instituição, buscando mitigar o risco atrelado à reputação e o risco legal/regulatório (…)” COIMBRA, Marcelo Aguiar; BINDER, Vanessa Alessi Manzi. Manual de compliance: preservando a boa governança e a integridade das organizações. São Paulo: Editora Atlas, 2010, p.2.

Programas de Compliance nas empresas que não têm relação com os entes estatais

E o que é Compliance[1]? Esse termo pode ser definido como o dever das empresas de estimular uma cultura organizacional que preza pela ética e pelo compromisso com as legislações. Melhor dizendo, Compliance é o cumprimento de normas, sejam elas leis ou políticas internas de uma companhia, com base em determinado padrão de conduta.

Compliance é cogente[2]?

Em tempos de importantes e grandes operações contra corrupção, a exemplo da Operação Lava Jato e tantas outras, programa de Compliance se torna cogente, ou seja, uma regra para as empresas que prestam serviços ou fornecem bens para o setor público.

As empresas que não têm relação com o Estado, notadamente as que não fornecem bens e/ou serviços, precisam ter Programa de Compliance?

Pois bem.

Com efeito, Programa de Conformidade é fazer a coisa certa[3] no ramo de atividade da organização, ou seja, exige-se hoje do gestor privado um dever de cuidado (dever de proteção e vigilância, notadamente pela importação e metamorfose da Teoria do Domínio do Fato e Teoria da Cegueira Deliberada pela nossa jurisprudência[4]) e de comportamento ético nas suas ações frentes aos Stakeholders, isto é, pelas partes interessadas -, clientes, fornecedores, sociedade, Estado etc.

Além do mais, o Brasil está permeado de agências regulatórias e diversos órgãos de controle estatal das atividades empresariais, no âmbito da União, Estados e Municípios.

Nesse dever de cuidado, hoje, de grande espectro, os gestores privados têm que cumprir normas internas, mas, também, muitas normas externas, notadamente as normas estatais de regulamentação da sua atividade empresarial, sob pena de sofrerem sanções administrativas, cíveis e penais.

Programa de Conformidade passou a ser uma grande ferramenta de resultados empresariais, notadamente pela mitigação de riscos e pela grande repercussão positiva à imagem da organização que o possui, seja pública ou privada, tenha ou não relação com entes estatais.

Além disso, um Programa de Compliance pode ir além do cumprimento de normas, isto é, seguindo na direção da Gestão da Organização, visando garantir o alcance dos objetivos e metas estabelecidas no Plano Estratégico da organização e a confirmação da eficácia do seu modelo de Gestão.

Nesse navegar, adotar um Programa de Compliance é um caminho sem volta, seja para as organizações públicas, seja para as empresas privadas, notadamente no caminho da Gestão Eficiente.

Carlos Queiroz.

Advogado. Especialista em Compliance e Sócio do Carlos Queiroz Advogados.


[1] “(…) o dever de cumprir, de estar em conformidade e fazer cumprir leis, diretrizes, regulamentos internos e externos, impostos às atividades da instituição, buscando mitigar o risco atrelado à reputação e o risco legal/regulatório (…)” (COIMBRA, Marcelo Aguiar; BINDER, Vanessa Alessi Manzi. Manual de compliance: preservando a boa governança e a integridade das organizações. São Paulo: Editora Atlas, 2010, p.2.

[2] Obrigatório.

[3] “Compliance é fazer a coisa certa” (Guia, PROGRAMA DE COMPLIANCE, CADE, Janeiro/2016)

[4] AP 470, STF.

O Crime de Estelionato à Luz da Lei

A lei nº 13.964/2019, que entrou em vigor em 23 de janeiro de 2020, conhecida como “pacote anticrime”, apesar de muito criticada, trouxe uma importante mudança no tocante ao crime de estelionato, previsto no art. 171, do Código Penal.

O crime de estelionato, em sua forma simples, consiste em obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro (art. 171, caput, CP). Tem como sujeito ativo uma ou mais pessoas com o objetivo de “enganar” alguém, visando uma vantagem indevida, e como sujeito passivo, a pessoa que sofre a lesão patrimonial.  

Referido delito, até então, era processado através de ação pública incondicionada, ou seja, o agente policial, quando do conhecimento do fato, instaurava o Inquérito Policial de ofício, e o Ministério Público oferecia a denúncia independente da vontade da vítima em ver o autor do crime ser incriminado.

Com o advento da nova lei, que acrescenta o § 5º no art. 171, CP, o crime passa a ter o regime de ação pública condicionada à representação. A vítima, agora, precisa registrar, mesmo após o do boletim de ocorrência ser exarado, a intenção de representar o autor, para que, em sendo o caso, a denúncia seja ofertada.

No entanto, tal mudança não veio acompanhada de uma regra de transação pré-definida, o que gerou diversos questionamentos e múltiplas interpretações, principalmente no que se refere à sua aplicabilidade em processos que já estão em tramitação.

A inovação contida no § 5º do art. 171, CP, é de conteúdo misto, o que significa dizer que há normas de conteúdo penal e normas de conteúdo processual, e por essa razão não foi interpretada de maneira uniforme, havendo divergências entre doutrinadores.

De um lado, há o entendimento de que a referida introdução do § 5º, pode (e deve) ser aplicada aos processos já existentes, eis que quando altera o regime da ação de pública incondicionada para pública condicionada à representação, cria uma situação jurídico-processual mais benéfica para o réu, valendo-se da regra de aplicação do direito material da lei penal no tempo, qual seja, o princípio da retroatividade[1].

Isso porque, repita-se, por se tratar de uma norma híbrida (direito processual e direito material), o entendimento majoritário da doutrina é de que a norma mista deverá retroagir se for mais benéfica ao agente, valendo-se da regra contida no art. 5º, XL, da Constituição Federal[2].

Sendo assim, como se aplicaria, na prática, tal normativa nos processos em que a denúncia já fora ofertada?

O art. 91 da Lei nº 9.099/95, estabelece que em casos em que se passe a exigir a representação para a propositura da ação penal pública, o ofendido ou seu representante legal, será intimado para oferecê-la no prazo de trinta dias, sob pena de decadência.

Dessa forma, utilizando-se de uma aplicação análoga do referido dispositivo, interpretado, juntamente com o art. 3º do Código Penal[3], o processo em tramitação deve ser sobrestado, no prazo de 30 dias, intimando a vítima ou o seu representante legal para que manifeste o interesse na representação. Decorrido o prazo sem a sua manifestação, extingue-se a punibilidade do agente pela decadência, com fulcro no art. 171, inc. IV do Código Penal.

Por outro lado, no entanto, entende-se que a introdução do § 5º, não gera efeito nos processos que já estão em julgamento. Em recente obra publicada pelo doutrinador Rogério Sanchez Cunha[4], preleciona que:

se a inicial acusatória (denúncia) já foi ofertada, trata-se de ato jurídico perfeito, não sendo alcançado pela mudança. Não nos parece correto o entendimento de que a vítima deve ser chamada para manifestar seu interesse em ver prosseguir o processo. Essa lição transforma a natureza jurídica da representação de condição de procedibilidade em condição de prosseguibilidade. A lei nova não exigiu essa manifestação (como fez no art. 88 da Lei 9.099/95).

Assim, na linha do entendimento acima esposado, depreende-se que em razão da representação da vítima não ser requisito de procedibilidade na época do fato, a instauração do inquérito policial de ofício e o consequente oferecimento da denúncia, constituiu ato jurídico perfeito e acabado, não havendo que se falar em necessidade de representação nos processos que entraram em curso antes da vigência da alteração aqui discutida.

Ainda, importante salientar as ressalvas invocadas pelo próprio art. 171, § 5º, CP, quais sejam: se a vítima do ato delituoso for a Administração Pública, direta ou indireta; criança ou adolescente; pessoa com deficiência mental; ou maior de 70 (setenta) anos de idade ou incapaz, o crime de estelionato será processado por ação pública incondicionada.

Registre-se, por oportuno, por não haver, até o momento, uma uniformização acerca do tema, a aplicação da inovação trazida pelo § 5º, do art. 171, CP, nos processos que já se encontram em tramitação, deve ser analisada caso a caso, devendo o advogado criminalista, sob a égide principiológica e na defesa do melhor interesse do cliente, requerer o sobrestamento do feito, para que haja expressa manifestação da vítima no interesse de representar o autor do suposto delito, sob pena de extinção da punibilidade do agente.

Juliana Neves

Advogada e Sócia do Carlos Queiroz Advogados.


[1]  “é indispensável investigar qual a que se apresenta mais favorável ao indivíduo tido como infrator. A lei anterior, quando for mais favorável, terá ultratividade e prevalecerá mesmo ao tempo de vigência da lei nova, apesar de já estar revogada. O inverso também é verdadeiro, isto é, quando a lei posterior foi mais benéfica, retroagirá para alcançar fatos cometidos antes de sua vigência” (BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 11. Ed. São Paulo: Saraiva, 2012. Vol. 1).

[2] “São aquelas que possuem conteúdo concomitantemente penal e processual, gerando, assim, consequências em ambos os ramos do Direito. Em tais casos, em atenção à regra do art. 5º, XL, da Constituição Federal, a lei nova deve retroagir sempre que for benéfica ao acusado, não podendo ser aplicada, ao reverso, quando puder prejudicar o autor do delito cometido antes de sua entrada em vigor”. (REIS & GONÇALVES, 2015, p. 40)

[3] Art. 3º – A lei excepcional ou temporária, embora decorrido o período de sua duração ou cessadas as circunstâncias que a determinaram, aplica-se ao fato praticado durante sua vigência.

[4] CUNHA, Rogério Sanchez. PACOTE ANTICRIME – Lei 13.964/2019 – Comentários às alterações no CP, CPP e LEP, Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 65).

Planejamento Sucessório como um Mecanismo de Sucesso nas Empresas Familiares

De acordo com dados do IBGE[1] – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas e do Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas, um pouco mais de 90% das empresas brasileiras são familiares. Segundo esse levantamento, 65% do PIB brasileiro vem de empresas familiares. No entanto, de cada 100 empresas familiares, apenas 30 empresas sobrevivem à primeira sucessão e 5 sobrevivem à segunda sucessão.

Diante desse cenário, observa-se que a sucessão patrimonial é um dos momentos mais críticos das empresas familiares, eis que coloca-se em risco todo patrimônio construído, por diversos fatores, dentre eles o do sucessor não estar preparado para condução dos negócios da empresa.

Do mesmo modo, a relação afetiva da família é colocada em xeque devido aos diversos entraves entre os sucessores que disputam melhores posições nesse processo.

Na verdade, o que se percebe, é a insatisfação de alguns futuros herdeiros com os termos do novo acordo familiar, o que pode resultar num imbróglio, desaguando até num litígio judicial, prejudicando, por conseguinte, a sustentabilidade do patrimônio e das próximas gerações.

Assim, empresas que antes apresentavam grande sucesso, fulminam em crise sem hora para terminar.

Por tais razões, o planejamento sucessório bem desenhado é um mecanismo de sucesso que possibilita a transmissão de patrimônio aos sucessores naturais, de forma  organizada e eficaz. Pode-se dizer, inclusive, que uma das principais intenções do planejamento é proporcionar uma sucessão eficiente na condução dos negócios, além de evitar possíveis conflitos familiares que, geralmente, ocorrem no momento da futura partilha e atrapalham a continuidade dos negócios.

Observa-se, ainda, que o papel essencial desse planejamento é proteger os bens de família, uma vez que possibilita a criação de mecanismos protecionistas ao patrimônio mesmo que ocorram eventos inesperados, como o divórcio e outros.

Além do mais, é imperioso dizer que o planejamento sucessório bem elaborado tem papel substancial na redução da carga tributária que, normalmente, incide quando da abertura da sucessão causa morte.

Ademais, fora a forte carga tributária devem ser somados os gastos com honorários advocatícios geralmente cobrados sobre o montante do espólio, que varia entre 10% a 20%. Assim, por todos esses cenário, é de fundamental importância a realização do planejamento sucessório. Até porque, esse planejamento elaborado pelos patriarcas organiza o futuro do patrimônio da família, bem como a continuidade dos negócios da empresa, considerando o afastamento de diversos problemas como: intromissão de terceiros; escolha do sucessor menos capacitado para administrar o negócio; conflito entre parentes; e, alta carga tributária.

José Cordeiro

Advogado e sócio da Carlos Queiroz Advogados.


[1] Disponível em: https://jornal.usp.br/atualidades/atualidades-em-dia-com-o-direito-boletim-18-10-empresas-familiares-representam-90-dos-empreendimentos-no-brasil/. Acesso em 15 de out. de 19.